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O ARTIGO 196 DA CARTA MAGNA E O “RANÇO” DE PATERNALISMO EM NOSSA CONSTITUIÇÃO:

Elisfabio Brito Duarte
Ficou célebre a máxima constitucional de que “A saúde é direito de todos e dever do Estado” – base legal de toda ação judicial envolvendo a Saúde Pública. Nada contra esse conceito constitucional em si, mas, por ser esse o fundamento em nossa moderna concepção de Estado com respeito à Saúde, penso que essa redação ficou a dever em substância.
Ora, Saúde não é apenas direito de todos. Deve ser também entendida como dever de todos, não apenas do Estado. Conceber a Saúde como dever apenas do Estado é contraproducente ao estabelecimento de sistemas de saúde sustentáveis, caracterizados pelo protagonismo do cidadão, e não pelo seu (des) empoderamento. Apesar da LOS preceituar que “O dever do Estado não exclui o das pessoas, da família, das empresas e da sociedade”, esse princípio tem sido ofuscado pela noção inconsequente e utópica de que o Estado, sozinho, poderá dar conta de todas as obrigações possíveis relativas à garantia do direito à saúde.
Exemplificando, consideremos os casos a seguir, nos quais um cidadão:
* Faz de sua residência/propriedade criadouro de vetores de doenças, ignorando as visitas/orientações dos agentes sanitários;
* Portador de doença contagiosa, promove sua proliferação não utilizando os medicamentos disponibilizados pelo SUS;
* Conduz seu veículo temerariamente e/ou embriagado; e
* Não pratica o autocuidado, vivendo deliberadamente de forma sedentária.
Nesses casos, o cidadão atenta contra a saúde de todos, diretamente ou por dar causa a agravos evitáveis que sobrecarregam o sistema. O conceito de Saúde deve ser entendido não apenas como direito desse cidadão, mas também como dever dele para com a saúde de todos. Logo, sem o exercício do dever em saúde, não é possível obter o direito à saúde.
E não propomos novidade conceitual. A Declaração de Alma-Ata estabeleceu que “É direito e dever dos povos participar individual e coletivamente no planejamento e na execução de seus cuidados de saúde”. A Carta de Ottawa, entre outras coisas, dispôs que “A saúde é construída pelo cuidado de cada um consigo mesmo e com os outros”.
No momento em que o mundo discute a viabilização dos sistemas de saúde, precisamos discutir meios sustentáveis de promovermos saúde para todos. Nessa discussão não há espaço para omissões; e governos, sociedades, instituições e cidadãos precisam assumir responsabilidades. Interessante estudo nesse sentido foi feito pela IBM Global Business Services (2006), no qual emerge o conceito de que “os consumidores assumam responsabilidade pessoal por sua saúde e maximizem o beneficio recebido de um sistema de saúde transformado”.
Ainda que todas as ponderações ideológicas possam ser feitas em relação às propostas do estudo feito pela IBM, um fato permanece: os sistemas de saúde, para serem sustentáveis, necessitam da corresponsabilização dos cidadãos. Precisamos evoluir para além da mera repetição dessa declaração-dogma de que Saúde é dever (apenas) do Estado. Precisamos trazer o cidadão para corresponsabilizar-se pela sustentabilidade do seu sistema de saúde. Há que se discutir, concomitante e inescapavelmente, a questão do claro delineamento do conceito da integralidade da atenção possível de o Estado assumir.
Penso, portanto, que o artigo 196 da Constituição deveria ser reescrito, pois deixou transparecer certo “ranço” paternalista do Estado, não estabelecendo a Saúde como direito e dever de todos. Assim, omitiu a corresponsabilidade dos sujeitos, e tudo que rompe com esse fundamental princípio, a meu ver, é alienante ao cidadão e contraproducente à sociedade.
REFERÊNCIAS:
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988. Brasília: Senado Federal, 1988.
______. Lei n.º 8.080, de 19 de setembro de 1990. Dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 20 set. 1990. p. 018055
IBM GLOBAL BUSINESS SERVICES. A saúde em 2015: “ganha-ganha” ou “todos perdem”? Um retrato e um caminho para uma transformação de sucesso. New York, IBM Institute for Business Value, 2006. Disponível em http://www.ibedess.org.br/imagens/biblioteca/482_IBM.pdf. Acesso em 15/01/2013.
OMS (1986). Carta de Ottawa para a promoção da saúde. Versão portuguesa “Uma Conferência Internacional para a Promoção da Saúde com vista a uma nova Saúde Pública”, 17-21 Novembro, Ottawa, Canada. Lisboa: Direcção Geral de Saúde.
OPAS/OMS. Declaração de Alma-Ata. Conferência Internacional sobre Cuidados Primários em Saúde. 1978. Disponível em: http://www.opas.org.br. Acesso em: 15/01/2013.
Professor e Administrador. Especialista em Gestão de Sistemas de Saúde. Especialista em Gestão de Serviços de Saúde.
 


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